Tribunal Pleno define teses em julgamento de IRDR sobre encargos bancários

Acórdão destaca necessidade de ciência prévia pelo consumidor sobre as cobranças e de analisar cada caso para decidir se cabe dano moral.


 

54395239844 31b909ba2c cO Tribunal de Justiça do Amazonas disponibilizou o Acórdão no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) 0004464-79.2023.8.04.0000, com a fixação das teses jurídicas sobre demandas de consumidores que tenham como objeto encargos bancários decorrentes do uso do crédito além do limite.

O incidente foi admitido em 10/08/2023, sob a relatoria do desembargador Cezar Bandiera, diante do elevado volume de ações sobre a questão e a fim de fixar jurisprudência, com a suspensão dos processos pendentes sobre o assunto.

No IRDR houve a admissão como amicus curiae das entidades Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Associação dos Advogados Defensores do Consumidor Amazonense (AADCAM) e Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Estado do Amazonas, que realizaram sustentação oral no início do julgamento, em novembro de 2024, assim como a instituição bancária apelada.

Após debates e apresentação de votos por outros desembargadores, o plenário fixou então cinco teses para o tema analisado.

Teses firmadas

A primeira tese afirma que “a natureza jurídica do desconto de encargos na conta-corrente do consumidor, oriundos da utilização de crédito fornecido por instituição bancária na mesma conta, é de obrigação acessória por consequência de inadimplemento de obrigação principal”.

Como consta no voto, os encargos bancários sob as rubricas denominadas “Mora Cred Pess” e “Enc Lim Crédito” têm origem na inadimplência do consumidor quanto ao pagamento do crédito utilizado e têm a função de compensar a instituição financeira pelo atraso; tais encargos são previstos em lei e sua cobrança condicionada ao descumprimento das obrigações pelo cliente.

A segunda tese define que “a utilização de serviços de crédito bancário gera presunção juris tantum de ciência prévia do consumidor em relação à eventual cobrança de encargos de mora”.

E a terceira tese é de que “a ciência prévia do consumidor sobre o valor das cobranças realizadas a título de 'Mora Cred Pess' e 'Enc Lim Crédito' deve ser comprovada por meio de instrumento escrito, assinado manual ou digitalmente, ou por outros meios eficazes e que detalhem as circunstâncias geradoras dos encargos e as condições para sua cobrança”.

No acórdão, o relator explica que a necessidade de comprovação por contrato específico da instituição financeira para a cobrança desses encargos é fundamental para a transparência e a segurança nas relações de consumo. E acrescenta que sem a comprovação contratual de quais encargos podem ser aplicados, estabelecendo claramente os direitos e deveres de ambas as partes, a cobrança de tais encargos deve ser considerada abusiva e em desacordo com as normas de proteção ao consumidor.

Além disso, o relator destaca que o simples fato de os encargos estarem previstos em regulamentos internos das instituições financeiras não é suficiente (pois tais regulamentos não são leis, de conhecimento obrigatório); e afirma que o contrato específico assegura ao consumidor o direito de plena informação, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

A quarta tese define que cabe a repetição de indébito em dobro (artigo 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor) de descontos indevidos a título de “Mora Cred Pess” e “Enc Lim Crédito”, que deve abranger: quando declarada a inexistência ou invalidade do negócio jurídico subjacente, a totalidade dos descontos; quando declarada apenas a violação do dever de informação relativamente aos encargos moratórios, a diferença entre os juros de mora e correção monetária cobrados e os índices supletivos previstos em lei (artigos 406 e 591, parágrafo único, do Código Civil), aplicados juros simples e mantida a validade da cobrança da obrigação principal.

Como observado no voto, a necessidade de devolver em dobro o valor cobrado devido à falta do dever de informar pela instituição bancária é uma forma de proteção ao consumidor, prevista no Código de Defesa do Consumidor. Tal penalidade tem o objetivo de evitar práticas abusivas pelas instituições financeiras, assegurando que os consumidores sejam devidamente informados sobre todas as condições contratuais, especialmente sobre os encargos financeiros. “Quando a instituição bancária não cumpre seu dever de informar, impõe-se a repetição em dobro do valor cobrado indevidamente, conforme estabelecido no artigo 42, parágrafo único, do CDC”, afirma o desembargador Cezar Bandiera.

E a quinta e última tese dispõe que “a ocorrência de dano moral deve ser analisada com base nas circunstâncias concretas do caso, não sendo suficiente a realização de desconto do encargo, por si só, para configurar o dano”.

Conforme a decisão, é preciso a apreciação de cada caso sobre a ocorrência de dano moral para que se tenha uma decisão justa e equitativa nas relações de consumo. “É necessário demonstrar que houve uma ofensa significativa aos direitos da personalidade do consumidor, capaz de causar-lhe sofrimento ou humilhação. A análise individualizada permite ao julgador avaliar se, além da ilicitude, houve um impacto relevante na esfera íntima do consumidor”, afirma trecho do voto do relator.

Causa-piloto

No julgamento da Apelação Cível n.º 0637291-28.2022.8.04.0001, da Primeira Câmara Cível, tida como causa-piloto para o IRDR, o recurso do cliente foi desprovido, mantendo-se integralmente a sentença que julgou improcedente ação de repetição de indébito que pretendia a devolução de valores cobrados indevidamente por descontos de encargos bancários “Mora Crédito Pessoal”. A previsão da cobrança dos valores pela instituição financeira foi comprovada por contrato, com menção expressa dos percentuais e da forma de cálculo a serem aplicados.

Fique por dentro

Amicus curiae – Amigo do tribunal, significando o terceiro no processo que é convocado pelo juiz para prestar informações ou esclarecer questões técnicas, inclusive jurídicas, que interessam à causa.

Juris tantum – De direito somente. O que resulta do próprio direito e somente a ele pertence.

Fonte: Glossário de Termos Jurídicos do MPF

 

#PraTodosVerem: Imagem que ilustra a matéria traz a foto do desembargador Cezar Bandiera, que aparece sentado e olhando para a tela de um computador. À frente do magistrado, está uma placa o gabinete e que traz seu nome.

 

Texto: Patrícia Ruon Stachon

Foto: Chico Batata / Arq. 18/03/2025

ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL / TJAM

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